2010-03-12

Esta noite serei um gato
a miar à tua janela
e trarei comigo
o mar dentro de um búzio.
Serei um peixe nas tuas ondas
Mediterrânicas.
Um polvo no teu fosso
Índico
Um mergulhador
na espuma da orla
Atlântica.
Um peixe-gato no oceano
Pacífico.
Um cavalo marinho
a trote
e a galope
o Mar Morto.
Esta noite. Só.
Serei um gato
Ou peixe gato.

2010-03-04

Todas as mulheres são árvores declinadas
com os seios pendidos como pomos
arrojados à firmeza dos dentes
de gatos que ascendem com suas garras

e afrontam felinos as nádegas
subindo e descendo pelo seu tronco
para atravessar uma faca
na estreiteza da corrente

dessas mulheres que são vulcões tenebrosos
com fundas fossas de um abismo oceânico
donde se desprende a sua lava menstrual

dessas mulheres como peixes num aquário
à espreita da sua eternidade
ou da rebentação de uma onda de espuma

que lhes restitua num fôlego
o gemido.

2010-03-03

Porque já não há em casa
cobertores suficientes
que nos agasalhem
do inverno glaciar
onde caímos
e nem os papéis
nos bastam
para atear o lume
é urgente
inventar o amor
(...)
Como se escrevessemos
a branco o clarão
para não mancharmos
de tinta a neve
nem a condição
do poema.