2009-12-28

Vemo-nos amanhã. Amanhã talvez o dia esteja mais luminoso

e eu te encontre quando o sol estiver no momento do entardecer

não sabendo se vá ou se fique, amanhã vemo-nos de certeza.

Depois da tua aula de anatomia, depois da minha de geografia.

Vemo-nos porque tem de ser assim, vemo-nos porque os porquês

já não se admitem hoje e por isso é mais prático que nos vejamos.

Porque a tua é uma aula simples sobre o corpo

e a minha, igualmente simples, mas sobre a terra.

Vemo-nos depois das aulas que podiam ser ambas de metafísica

porque ambas são as duas, a minha e a tua estão antes da realidade

do mundo, do amor, da liberdade e da vida.

Vemo-nos amanhã, porque amanhã é um novo dia

os outros passaram na convicção histórica do que aconteceu

e filosófica futura do que teria sido se não acontecesse - assim.

Porque o sol não deixará de aparecer até que o último homem comprove

e na sua derradeira aparição o faça sorrir de tédio ou de cansaço.

Por saber que milhões e milhões de vezes o sol inspirou a vida

e a vida reconheceu a luz até à noite, amanhã vemos-nos.

Tu despida com a pele daquele vestido de seda ou de cetim

que te torneiam o corpo de mulher pronta e madura.

E eu despido também, mas com um nó de certezas na gravata

de que essa tua aparição é tão exacta como se estivesses

de bisturi na mão pronta a abrir-me as entranhas

na convicção de recolheres nas vísceras a minha alma.

Estarei com as mangas da camisa arregaçadas

para que comproves que os meus braços

em volta do teu corpo têm a mesma latitude.

Vemo-nos amanhã, para nos tornarmos

anatómica, geográfica e histórico-filosoficamente unidos

num abraço que dispensa o sol.

Afinal a noite traz o benefício de guardar a luz

para que os homens e as mulheres se conheçam pelo tacto.

Pour Ana Beatriz et son héros Gulliver

Tu verras, nous retournerons au point de départ

Et nous danserons ensemble vers l’oubli.

Peut-être que je n’arriverai plus chez toi

Il est peu probable que je trouve le chemin de retour.

Mes pieds s’emmêlent dans les cheveux

Et je suis fatigué de lutter contre les interminables murs

de tissu capillaire

la brutale machine de la trame des discours de dieu.

Dix canifs poussent de mes mains

Chacun est un couteau pour trouver le chemin

Chacun est une arme blanche pointée vers l’oubli

Chacun est un couteau pointé vers le mot oubli

Ou aux mots chemin et oubli.

Je garde dans mes poches les papiers que tu m’a donné

Les noms qui ont inventé chaque lettre de l’alphabet

La lettre qui a dessiné les numéros et les jours de la semaine.

Je suis couché à compter les jours, tu sais

Je ne sais pas d’où me sont nées les racines que j’ai dans les yeux

Chacune est un fleuve dans les miroirs, un morceau de moi dans les miroirs

Comme un bateau ancré ou à la dérive dans ce siècle.

J’écris pour lutter contre la folie de mourir à l’intérieur

Me souvenir de la pré histoire d’être lá avec moi, quand était-ce ?

Je ne sais pas quand sont nées ces cicatrices dans la chair ou dans les yeux

Certainement dans ton premier cri

Comme cent violons au plus profond de moi-même

Un hymne à la certitude de rester ici .

J’attendrai que le calendrier nous ramène vers le début

Et me rende dans la peau les années perdues dans ces papiers.

Qu’il me rende la certitude de ne pas oublier

Et dans les autres siècles de me souvenir

Du jour où je reviendrai, mon amour.

(agradeço a tradução à minha amiga e colega Sílvia Rodrigues)

2009-12-03

Tenho porém
uma coisa

a dizer:
NÃO SOU POETA.
Os poetas todos
são loucos
e eu só padeço
dos dentes do siso
quando alguma

musa despida
me faz
perder o juízo.


(história do último desejo do homem que queria ser poeta)