2008-11-22

da verdade sabemos pouco
tanto como o relógio dos seus próprios ponteiros.

há um segundo atrás
dois segundos talvez para ser mais preciso
eu sabia a palavra exacta
era cão
pelo eco que faz na cabeça
cccaaaaaaaaãoãoãoãoãoãoãouuuuummmmm.

e o cão mordeu a morte sem darmos por isso
contabilizei exactamente quatro minutos e trinta e três segundos
nenhuma verdade.

o cão vadio de uma arma Vitor Charrasqueta de 1960
cartão, chumbo, feltro, copela, pólvora e fulminante deixado num dos canos
a mão esquerda no fuste
a face apoiada na coronha de madeira
o guarda-mato com gravura de flores e
o gatilho no indicador da mão direita.

dois meninos a brincar- um tiro certeiro só.

nenhuma verdade
em quatro minutos e trinta e três segundos
a espingarda disparou.

pppouuuuuummmmmmmmm.
tic,tac, tic, tac, tic, tac, tic, tac,
tic, tac, tic, tac,
tic,tac, tic,
tac,

tic

tac
(e o coração parou)

2008-11-01

a mão que envolve outra mão
dorme profundamente no leito de um livro
depois de escrever no seu interior.

umA mão de carne com LINhas de áGUA
e de gestos de pão
semeia os Dedos na carnE de um Livro
desvendA a página primeirA e dedilha as cordaS dos cabelos.

as MinhAs mãOS
duas
são irmãs que caminham para DentrO dos lIvroS
gémeas que desenham OLHOs doceS
Despedem sE com LetrAs matinais -bom dia
e outras incandEscentes de precipício - adeus.

As minhas mãos
aS minhas Mãos vazIas resguardam-se nos livros
soNHam casas pequenAS e quartos interiores sem luz.

as minhas MÃOS despRENDem-se dos lIvros
e Depois voltam a abrir as mesmas páginAS.